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quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Leiloar a virgindade é prostituir-se? (final)

Inácio A . Torres


Por último, abordaremos alguns pontos da história da prostituição. Como primeiro ponto, façamos a correção de uma sentença equivocada que atravessa séculos; a de que a prostituição é a profissão mais antiga do mundo. Essa informação não encontra respaldo antropológico ou histórico. Os mais remotos registros de atividades humanas revelam como ocupações mais antigas a agricultura e a caça. A prostituição aparece em contexto social muito posterior.

Por outro lado, destaque-se esse dado interessante sobre a prostituição. Na Grécia antiga, as relações pagas com mulheres ou com homens não eram condenadas. Muito pelo contrário: eram normatizadas e estabelecidas pelo Estado. Essa normatização não gerava mal-estar entre os clientes e as prostitutas, pois ambas as partes ficavam satisfeitas. As tarifas dos serviços oferecidos nos bordéis eram fixados pelo estado, que zelava para que as taxas fossem respeitadas. Nesse ambiente, tudo o que acontecia guardava-se a sete chaves. Para os gregos, os bordéis eram setor de sigilo. Esse cuidado para com o anonimato dos frequentadores, seduzia tanto que algumas mulheres da alta sociedade arriscavam sua posição social por uma experiência em um desses estabelecimentos.

Nos dias de hoje, eles representariam os motéis que, conforme Aurélio são “hotéis situados à beira de estradas de grande circulação, dotados de apartamentos para hóspedes, estacionamento e restaurante”. E também são verdadeiras fortalezas, que se transformam quase sempre em um lugar bem defendido, escondido e apropriado para relações amorosas extraconjugais. 

Por aquela época, o sexo pago era tão forte, que até mesmo a rigidez moral da igreja medieval, não teve competência para exterminá-lo. Satisfeitos com essa situação, os reis faziam dos bordéis a válvula de escape de uma libido que podia se transformar em violência sexual. Porém em 1684, no reinado de Luís XIV, a prostituição foi considerada crime e decretada prisão de todas as meretrizes em atividade na França. E no século XVII o sexo pago tornou-se caso de polícia.

Com essa legislação, depois de julgadas e condenadas, as prostitutas eram levadas para o cárcere em uma charrete aberta, onde sem proteção do estado eram insultadas e humilhadas, sendo algumas vezes até apedrejadas ou escarradas em via pública. Daquele tempo para cá houve muitas transformações e avanços, mas mesmo assim, as profissionais do sexo atuais vivem sem segurança e sofrem maus tratos de toda sorte, financeiro, moral, psicológico e físicos dentro e fora de motéis e de casas de prostituição. 

Evidencia-se que o conceito permanece o mesmo: prostituição é a troca consciente de favores sexuais por dinheiro. É o comércio habitual ou profissional de atividade sexual, praticado mais comumente por mulheres, - mas comprovadamente há inúmeros casos de prostituição masculina e a até entre homoafetivos - em diversos países do mundo.

No início do século XX, objetivando descriminalizar a prostituição, pois nessa época a exploração sexual era executada por grandes grupos do crime organizado, alguns países ocidentais tomaram medidas para desvincular prostituição propriamente dita de crime, de forma a diminuir o lucro dos criminosos. Dessa forma, as prostitutas só poderiam ser perseguidas pelos órgãos de repressão se incitassem a atividade publicamente. A luta continuou e hoje a prostituição (troca de sexo por dinheiro) é legal, porém as atividades organizadas, tais como prostíbulos e lenocínio são ilegais, uma vez que a prostituição não é regulamentada. Esforços para fiscalizar e controlar a prostituição no mundo inteiro têm sido feitos, desde 1949, pela Organização das Nações Unidas/ONU. Alguns com sucesso e outras nem tanto, porém a ordem é insistir sobretudo com a execução de projetos de políticas públicas para o setor.

No início dos anos noventa, o Ministério da Saúde/MS e a Universidade Nacional de Brasília/UNB realizaram uma pesquisa cujo resultado mostrou que, no segundo semestre de 2005, quase 40% das profissionais do sexo atuavam há, no máximo, quatro anos. Esse dado seria um indicador de que haveria um alto grau de abandono da profissão. Para o Centro de Educação Sexual, uma ONG que realiza trabalhos com garotas e garotos de programa do Rio de Janeiro e Niterói, a maioria dos profissionais do sexo se prostitui para sobreviver, tendo muitas delas o sonho de encontrar um grande amor.

Como se vê, a atividade de prostituição no Brasil em si não é considerada ilegal, não incorrendo em penas nem aos clientes, nem às pessoas que se prostituem. Entretanto, o estímulo à prostituição e a contratação de mulheres para atuarem como profissionais do sexo é considerado crime, punível com prisão (Lenocínio). Alguns países já reconhecem legalmente a prostituição como profissão. A Alemanha é um deles.

Um dado estarrecedor: no Brasil, a prostituição infantil é comum nas camadas mais pobres dos grandes centros urbanos. Nas capitais do Nordeste em especial, existe o turismo sexual, onde crianças e adolescentes de ambos os sexos são recrutados para satisfazer os desejos de pedófilos procedentes de todas as partes do mundo, principalmente da Europa e dos Estados Unidos.

A história da prostituição infantil vem de longe. Na Grécia, o número de mães que prostituíam as próprias filhas era enorme. Mal o sol se punha, já estavam em busca de clientes para essas meninas. No Brasil atual, essa situação está presente em todas as regiões, essencialmente nas periferias de grandes cidades.

Na ficção, tem servido de mote para filmes, peças teatrais e novelas. A escritora Glória Peres, tentando, como ela mesma diz, dar visibilidade ao invisível e voz aos que não têm voz, está escrevendo o folhetim Salve Jorge que tem como tema central o tráfico internacional de mulheres.

Os ambientes escolhidos pela escritora foram: no Brasil, o Morro do Alemão, no Rio de Janeiro; e na Turquia, as cidades históricas de Istambul e Capadócia. A narrativa fala de sonhos roubados de muitas crianças e adolescentes que, na busca de realização profissional e da fama, acabam por vivenciar pesadelos dolorosos promovidos pelo tráfico humano internacional. É a ficção confundido-se com a realidade, pois no mesmo cenário em que foram gravadas cenas da Salve Jorge, conforme a imprensa noticiou, mães servem de caftinas para as filhas adolescentes e até crianças.

É importante lembrar, que desde o início da prostituição há estratificação das profissionais do sexo. Na Grécia antiga, as “ pornai” (em grego quer dizer mulheres à venda) eram escravas compradas no mercado e instaladas em pequenas celas fechadas por uma cortina durante o programa. As “operárias” do sexo eram mulheres decorativas que animavam festejos e reuniões dos ricos atenienses e às profissionais do sexo que tinham elegância e autonomia para comercializar seu corpo, isto é, não dependiam de cafetão denominavam de “hetairas”. Essa situação perdura com outras denominações e tipificações. 

Atualmente com a popularização dos novos meios de comunicação em massa, surgiram novas formas de prostituição. Alguns exemplos: o sexo por telefone e sites onde o sexo é vendido em filmes, em imagens, em “web cams” ao vivo etc., criando uma nova forma da atividade: a prostituição virtual, mais atraente e mais perigosa, pois invade com facilidade os lares desconsiderando a idade humana como ponto de censura. Pior: no Brasil, a legislação sobre o assunto ainda é incipiente, favorecendo a impunidade dos infratores.

Conclusão: a prostituição é uma ocupação que existe há mais de 2.500 anos. Fez-se presente nas idades antiga, média, moderna e chegou à contemporaneidade. Acompanhou a evolução dos humanos, adaptou-se às novas tecnologias e adotou novas metodologias para a burlar a lei. Portanto, a catarinense não há o que verberar contra a opinião pública e a imprensa. Aliás, foi ela mesma quem tornou público seu contrato, cujo teor informa tratar-se de uma relação sexual entre maiores de idade, com pagamento através de leilão; constando ainda as seguintes obrigações: duração de uma hora, perda da virgindade, ausência de beijo na boca e uso de preservativo. Com certeza, esse será um dos contratos mais bem construídos em toda a história das relações sexuais pagas. Sinceramente, leiloar a virgindade nessas condições e, por cima, dizer que não se trata de um ato de prostituição é querer negar toda a história do mundo dos profissionais do sexo, desde a Grécia antiga até os dias atuais. O parecer agora fica por conta do leitor.

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