Inácio Andrade Torres
Esse assunto envolve
um quadrilátero que muito contribui para a promoção da saúde humana, composto
dos fatores: a fisiologia, a emocionalidade, a espiritualidade, e a
intelectualidade. Bem equilibrados esses fatores concorrem verdadeiramente para
a formação de uma mente e de um corpo saudáveis.
Como estamos
vivenciando o 8 de março, Dia Internacional da Mulher, julgamos pertinente,
construir um texto que certamente servirá para uma reflexão sobre a dor
feminina, uma questão de gênero pouco debatida na família, na escola e na
sociedade. Aqui nos reportaremos à dor como uma experiência sensitiva e
emocional desagradável relacionada real ou potencial dos tecidos. A dor como
sinal de alerta que avisa a existência de algo errado no funcionamento do
corpo, logo aconselhando cuidados.
De início,
expliquemos. A dor humana tem as seguintes dimensões: física, psíquica, social
e espiritual. A psíquica é a dimensão do sofrimento que pode ter causas associadas
à saúde física, mental, social, financeira, espiritual e emocional. A dor
psíquica, embora tenha causa invisível, dói muito, machuca, fere, maltrata.
Essa dor tem como agentes desencadeadores, por exemplo: o enfrentamento de uma
doença crônica, torturas psicológicas, perdas, injustiças, culpa e até medo da
morte.
No caso das mulheres,
a dor psicológica pode originar-se de violências sofridas na infância e
adolescência que podem estender-se até a maturidade e à velhice. A dor da
violência sexual, por exemplo, fere o corpo, porém atinge mais a alma, destrói
sonhos e acaba com a dignidade da mulher. Para reforçar esses argumentos,
utilizaremos a seguir um texto de Onilza Braga que, embora escrito em 1994,
realisticamente, comprova a violência contra a mulher na legislação. Situação
que, graças a Lei Maria da Penha, tem se transformando, na medida em que
diminui injustiças, ampara mulheres agredidas e oferece segurança aquelas que
denunciam corajosamente maus tratos. Diz Onilza:
“Em uma cidade do
interior de Minas, ficou viúva a mulher de um funcionário da prefeitura. Ela
vivia com ele há mais de dez anos e tinham oito filhos, além de três filhos
dele com outra, que ela também criava. Mas não eram casados oficialmente. No
mesmo dia do enterro, três amigos dele, preocupados com a mulher e as crianças,
que eram muito pobres, resolveram tomar providências para que ela recebesse a
pensão do INPS como companheira dele. Mas isso não poderia ser assim, de graça,
sem mais nem menos. Foram fazer uma vistoria na casa, para ver se ela merecia a
pensão!
Voltando, trouxeram o
parecer: ‘Ela merece a pensão, sim. E vamos trabalhar para ajudar. Vimos tudo.
Não tinha nenhuma roupa de molho no tanque, a casa estava arrumada, as camisas
e calças dele penduradas em cabide num cordão que passava de uma parede a outra
na quina do quarto, as cuecas estavam lavadas, remendadas e arrumadas numa
caixinha. As crianças estavam limpas e as panelas brilhando no estaleiro.’
Ou seja, nem no dia da
morte do marido ela poderia ter se atrasado em nenhuma obrigação, ou teria
perdido o INPS para terminar de criar os filhos! Mas ninguém se preocupou em
saber se estava doente, cheia de varizes, se seus dentes ou a alma, estavam
corroídos de desgosto.”
Sem dúvida, nas
últimas décadas, as mulheres avançaram muito, tiveram significativos
ganhos sociais e políticos, porém, por outro lado, conforme as
estatísticas, na relação saúde e violência, elas continuam necessitando de
melhor acolhimento, cuidados e atenção por parte da família (maridos, filhos,
netos...) e dos governantes.
Aliás, conforme a
Associação Americana de Medicina, na mulher, o estresse produzido por viver em
situação de violência constante pode causar transtornos de apetite, sono,
fadiga, déficit de atenção, disfunção sexual, dores abdominais e
gastrointestinais, problema ginecológicos e outros sintomas.
Médicos e enfermeiros
indicam que enfermidades crônicas como asma, epilepsia, diabetes, artrites,
hipertensão, e doenças coronarianas são exacerbadas ou precariamente controladas
em mulheres que sofrem violência. Mais ainda: um parceiro violento pode usar do
poder e controle dentro da relação para limitar o acesso a cuidados de saúde de
rotina ou de emergência, proibir a obtenção ou o uso de medicamentos e o
prosseguimento do tratamento de doenças crônica (cânceres e outras).
Acrescente-se ainda que pesquisas têm demonstrado que mulheres submetidas
à violência estão mais suscetíveis a contraírem o vírus HIV.
A verdade é que,
nestes últimos quarenta anos, se por um lado verificou-se incontestável e
surpreendente evolução social, econômica e política das mulheres ocidentais,
por outro constatou-se aumento na exposição delas a fatores de risco de doenças
cardiovasculares, pulmonares, cânceres e outras. Hoje, em muitos países, proporcionalmente
as mulheres estão consumindo mais cigarros que os homens. Com o alcoolismo, não
tem sido diferente. O aumento de mulheres alcoolistas aumentou
consideravelmente nas últimas décadas.
Mediante a realidade
atual, pode-se dizer que o argumento de artigo da Veja, lá de 1994, continua
com validade: “A mulher brasileira precisa manter a forma, criar os filhos,
evitar que novos apareçam, fazer do corpo uma pilha que não acaba para suas
várias jornadas de trabalho. Tudo ao mesmo tempo: cólicas menstruais, hormônio
sintético, crises de ansiedade e calmantes.”
Com tantos afazeres a
mulher negligencia suas dores do coração. E assim essas dores vão evoluindo e
sendo desvalorizadas por elas e pelos profissionais de saúde. São poucos os que
percebem a sintomatologia iniciante, as causas dessas dores. De repente o
infarto, uma... duas fisgadas no peito... a ligação para o SAMU... a correria
para o hospital. E na antessala, familiares, amigos e curiosos reconhecem, por
unanimidade, valores da paciente: essa mulher cuidou mais dos outros do que
dela própria, ela foi uma esposa e mãe de família exemplar, viveu sempre a
serviço da família, do trabalho e acabou esquecendo-se de dar mais atenção a
sua saúde! Fala-se no passado como se a paciente fora a óbito.
O cardiologista João
Nussbacher assegura que, “além da maior prevalência de fatores de risco para
doença miocárdica e de haver particularidades biológicas próprias do sexo
feminino, o coração da mulher é diferente.”
Encerramos esse ensaio
com essa reflexão da médica cearense, Maria Angélica Malveira, (autora do
livro: "Porque dói o coração da mulheres.") quando diz: [...] “E o
coração vai doendo devagarinho, vai mostrando sinais, provocando palpitações,
faltando ar; o coração de todo modo, vai projetando a sua plena existência:
padece, se contrai, se alegre, dói e adoece”.
Isso posto, torcemos
para que - todos nós homens e mulheres - tomemos mais consciência e adquiramos
mais conhecimentos, competência e habilidade para tratarmos, respeitarmos,
valorizarmos e cuidarmos cada vez mais e melhor das dores visíveis e invisíveis
do coração das mulheres.