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sexta-feira, 5 de setembro de 2008

WALDIK – SEMPRE NO MEU CORAÇÃO


Inácio Andrade Torres* (foto)
Especial para o garimpandopalavras

Morreu ontem, aos 75 anos, no Instituto Nacional de Câncer, Euripedes Waldik Soriano, um dos maiores ídolos da música popular brasileira.
Em autobiografia, produzida pelo jornal Pasquim, ele disse que seu nascimento aconteceu às dez horas de uma manhã de sábado, dia de feira, lá no sertão da Bahia, no lugarejo chamado Brejinho das Ametistas, município de Caitité, exatamente no dia 13 de maio de 1933. Sua mãe chamava-se Eudóxia Evangelista Garcia e seu pai Manuel Sebastião Soriano. A parteira foi Mãe Santinha, a qual, conforme Waldik, depois de cortar o umbigo do recém nascido e por pó-de-café para estancar o sangue, disse em voz alta: é Homem.
Daí para a frente, foi só luta para ajudar a família. Foi agricultor, garimpeiro, faxineiro, engraxate, servente de pedreiro, sanfoneiro – tocava fole de oito baixos - , motorista de caminhão, violonista, compositor e finalmente cantor consagrado pelo povo brasileiro.
Especializado em cantar desilusões amorosas e em defender as mulheres, Waldik ganhou notoriedade e respeito em todos as classes sociais agradando desde modestas empregadas domésticas às madamas da alta sociedade; desde o analfabeto ao cientistas social e da medicina. Foi e sempre será assim. Todo artista que respeita o seu público, será reconhecido e valorizado. Com Waldik Soriano não podia ser diferente. Com sua forma simples, carismática e agradável, cantou as dores e o sofrimento do povo. Foi um boêmio entendido nas dores amorosas, realmente um cantor de estilo inimitável, um ícone popular.
Percorreu o Brasil, sobretudo o Nordeste, realizando shows nos mais diversificados ambientes, como picadeiros de circo, comícios, feiras livres, cinemas, bordéis e boites das mais simples a mais sofisticadas, a exemplo da Flag, uma casa freqüentada por homens e mulheres da grã-finagem paulista e carioca, que em noitada memorável ao ouvirem a orquestra e a voz de Waldik caíram em verdadeiro delírio e loucura como nunca vistos antes naquele recinto.
Para ser cantor, Waldik Soriano enfrentou muitas lutas até alcançar a glória. No lar a incompreensão do pai, que dizia que “boa família não dá boêmio vagabundo, principalmente sanfoneiro”. Esforçou-se muito para sair das brenhas do garimpo e da roça e ganhar a vida como motorista de caminhão, pára só então depois conseguir com garra gravar o primeiro disco. Daí para frente, graças a sua facilidade em construir versos simples contando os dramas e paixões populares, tornou-se querido e amado.
Mas como todo humano, foi amado por uns e incompreendido por outros. A sinceridade de Waldik Soriano custou-lhe caro em alguns momentos e promoveu-lhe tropeços e embaraços. A imprensa, por exemplo, em algumas ocasiões, como ele mesmo disse em sua autobiografia, “ora lhe elogiava, ora baixava-lhe o pau. Parece uma coisa estabelecida, eu preciso deles e eles de mim”.
Dessa relação polêmica, extraímos alguns textos de jornais nos quais ele aparece como personagem central. Eis algumas manchetes envolvendo o seu nome: Waldik: Vou fazer de frei Damião o Papa da Igreja Brasileira; Waldik Soriano está fazendo curioso regime para emagrecer: pitu com tomate; Por causa de Waldik Soriano, vereador invade igreja e rasga batina de padre; Por causa de Waldik Soriano quatro irmãos brigam: um morto; Waldik Soriano e Roberto Carlos recebem troféu repórter: melhores cantores; e Waldik é o Frank Sinatra do Nordeste.
Homem justo e sincero e, ao contrário do que muitos pensam, Waldik Soriano nunca foi um machão. É tanto que sempre recebeu das artistas brasileiras grande reconhecimento, carinho e admiração. Nesses últimos anos, morando em Fortaleza, e sendo portador de um câncer de próstata, foi convidado pela atriz Patrícia Pilar de quem era muito amigo, para fazer um filme sobre sua vida. Depois de pronto, o DVD foi intitulado Waldik – sempre no meu coração, sendo apresentado em todo o país, obtendo grande sucesso e valendo-lhe a oportunidade de participação em vários programas de rádio e televisão, dentre os quais o de Ana Maria Braga, da Globo, no qual narrou seu repertório de vida concluindo com a reflexão de que a coisa mais importante desse mundo é o respeito e a justiça; e a mais odiosa e sem fundamento é o preconceito.
Waldik Soriano casou-se três vezes e deixou seis filhos. Nunca foi preconceituoso tampouco machista. A prova maior disso está nesse depoimento que deu ao jornalista Bernardino Campos e que serve de exemplo para a época atual onde ainda reina tanta discriminação e violência contra as mulheres.
“Na primeira fila de cadeiras do cinemaestava sentada uma jovem, morena, cor de jambo, cabelos longos e pretos firmamos um olhar um no outro cantei a minha última canção Tortura de amor despedi-me do público após uma semana juntos, apaixonamo-nos perdidamente um pelo outro. Mesmo sabendo tratar-se de uma prostituta. Porém, como meu amor não tem preconceitos, amei Maria José, conhecida como Zelita, até o fim de sua vida”.
Eis uma das razões pelas quais Waldik Soriano tornou-se tão amado pelo povo do Brasil. O seu caráter elevado e senso de justiça para com os párias valerão sempre como pontos de referência, não só de seu público, mas de todos os seres humanos que têm sentimento sincero, que manifestam atitudes decentes e respeitosas e que pensam no bem-estar do amigo, do irmão e do próximo. Por tudo isso, vale a pena realçarmos no final desse ensaio, a feliz citação do filme de Patrícia Pilar: “Waldik – sempre no meu coração”.

* Inácio Andrade Torres – professor da UFCG/ Campus Cajazeiras.

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