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sábado, 26 de janeiro de 2008

Crônica


A VIDA É ALGO INACABADO
Por Misael Nóbrega de Sousa

Como ser surdo e não ouvir as próprias palavras? O mundo está cheio disso. O fardo da descoberta é tão pesado, quanto um calvário do inacabado. Se é um grande mal enganar aos outros, imagine a si mesmo?. Os meus caminhos são sinuosos. Mesmo assim, arrisco pregar o bem, como se fosse um catequista; por outro lado, não tenho na fé, o ideário de vencer o menor dos meus medos.

Quem dentre milhões realizará o sonho de ser quem é? Apenas o amor liberta. Mas não há significado para ele; verbo ou gesto que o santifique; nada. Vivemos, tão somente, com a obrigação dos dias. E, para cada sol que surge acima do horizonte, uma esperança cai de joelhos aos pés do altar, clamando pela terminação. Mesmo assim, a morte não põe fim à vida. A morte ceifa a vida em qualquer parte da trajetória, ao bel-prazer do escárnio. E diz que isso é destino.

É uma heresia supor que Deus perdoará uma vida de prazeres e vinho; mesmo que o moribundo deixe de ser um pagão, no leito derradeiro. Imagino que posso ter a indulgência da morte proferindo preces em silêncio. E, assim, calado, sofro o doloroso baque – É quando a inspiração me é roubada dos pulmões; e apenas um último e longo suspiro é permitido, como cerimônia. E deste modo, sem o esforço da luz, tudo vira começo. O antes do antes. Um procedimento parecido com o da alma em transmutação... – para que a morte física possa ter alguma utilidade, enfim. E isso é, também, um delírio de minha mente. Mas, adoraria morrer na loucura que Erasmo de Rotterdam diz ser o único bem supremo.

É sabido que não há escolha. Porém, mesmo se houvesse não queríamos a vida: assim, tão passageira como um sonho de criança – inocente e, ao mesmo tempo, mordaz. Vida que se apresenta compromissada com o ofertório dela mesma, é bem verdade. E nem sequer a memória permanece ativa, mesmo naqueles que disseram nos devotar os mais sinceros segredos... – logo enterrarão, também, a centelha que resistia à vontade de supra-existir. Não somos quem podemos ser; é fato. Não há tempo. E por mais que nos esforcemos para acreditar que pode ser diferente... - É hora de tudo acabar.

(o desejo é o pior dos crimes).

Se a vida fosse uma melodia seria a nona sinfonia de Beethoven, reconheço: pois só a um gênio é permitido ser surdo; e, mesmo sem ouvir as próprias palavras, consegue recriar a voz de Deus, para reproduzi-la através dos séculos, sem fim. Pra mim é indiferente viver ou morrer; porquanto não conheço nenhuma das duas faces.

Professor e jornalista

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